quinta-feira, 22 de julho de 2010

A Simbologia do corpo em 'Antropologia da Comunicação Visual', de Massimo Canevacci.



Com o término da guerra fria (década de 1950) a juventude libertou-se da perspectiva da experiência da guerra, de fato, e com isso emergiu dentre os mesmos uma falsa sensação de liberdade, a qual era expressa nas vestimentas, no comportamento e no imaginário. No entanto, tal sensação de liberdade chocava-se diretamente com as normas morais vigentes de então, e com ela, veio também uma grande onda de repressão à mesma. Dentro desses anos, no meio de todas as contradições sociais de então, “O corpo tornou-se o símbolo que remete à utopia de uma sociedade harmonizada com a natureza, depois de dissolvidas as ilusões das mercadorias.” (CANEVACCI, 1990) e as crescentes quantidades de imagens que remetiam ao mesmo iam de encontro com as relações jurídicas e éticas de tal contexto.

Um belo retrato de tal momento pode ser conferido no filme Easy Rider, dirigido por Dennis Hopper e lançado em 1969, onde dois amigos viajam pelos EUA no fim da década de 1960, experimentando tanto as venturas quanto as desventuras desta incipiente liberdade. As mensagens corporais tornam-se uma obsesão da civilização, ao mesmo tempo em que supostamente legitimam a maturidade dos indivíduos . Uma “cultura do consumo”, onde cada um e seu modelo de vida tornam-se mercadorias, passa a se instituir e se estabelecer a partir do estabelecimento e difusão compulsiva de símbolos. Tais símbolos incitam seu consumo, e minúcias passam a distinguir roupas e livros, bem como classes e subculturas.

A troca de mercadorias passa a implicar em troca de imagens e experiências corporais, segundo Canevacci, nasce um “status game” onde cada um expõe seus próprios signos e dedica-se a decifrar os que os cercam, para chegar dessa forma a uma “consciência do seu papel”. Esta sociedade, definida pelo autor como “pós-industrial”, utilizada tão demasiadamente os signos que termina por gerar uma “sign-flacion” onde o corpo situa-se no centro. Tal ‘cultura do consumo’, preocupa-se mais com o estabelecimento de hierarquias e diferenças de gosto, do que com sua suposta autonomia.

No interior do significado do termo símbolo, subjaz a existência de algo maior ao qual tal símbolo remete, este funciona como a parte fracionada de um todo e aludir constitui sua “condição existencial”. Com o advento da sign-flacion, o processo de simbolização começa retroceder. Segundo Canevacci, uma pressão social passa a desejar com mais intensidade uma união rápida do signo ao todo que representa, iniciando dessa forma uma “dessimbolização do corpo em público”. Cultura de massa e cultura visual passam a fundir-se.

Para Canevacci, 2 exemplos dessa ânsia pela união rápida ou até mesmo óbvia entre o símbolo e seu todo são fundamentais, a video-music e as simulações sexuais em público. Segundo o autor, o corpo e o sexo tornam-se mais eles mesmos, na medida em que passam a ser visualizados, musicalizados e representados em público, “(...) os símbolos sexuais, expressos tradicionalmente pela música e pela dança, são agora concentrados e acelerados em performances repetitivas – o video scape -, que expõe atos genitais dessimbolizados.” (CANEVACCI, 1990). Esse novo cenário, dos clipes musicais, proporcionam uma paisagem onde o narcisismo e a simulação sexual se condensam em verdadeiros “manuais sexuais”. As imagens abaixo foram retiradas de clipes musicais contemporâneos:

Prince 50 Cent Lady Gaga

Simulações sexuais em público é o segundo exemplo, citado por Canevacci. Segundo o autor, tais simulações representam transformações antropológicas mais abrangentes referentes aos valores sociais aceitos. O quadro abaixo, retirado do texto de Canevacci, exemplifica tais posições, atravéz das quais os jovens, a partir da divulgação de habitos privados, adquirem status de maturidade genital.



Numa breve comparação conclusiva, o videograma musical de Prince ou de Madonna produz um video-scape através da reprodutididade técnica; e o ideograma corporal dos jovens pares produz um visual-scape através da aurática ‘hic et nunc’. Ambos são aspectos da ‘paisagem cultural visual, que unifica os códigos e comportamentos através da dessimbolização do herói em público. ” (CANEVACCI, 1990). A comunicação visual, e sua característica reprodutividade, proporciona ao corpo, então, a capacidade de apresentar-se como ambiente rico em possibilidades de montagens simbólicas.


Referências

- CANEVACCI, Massimo. Antropologia da Comunicação Visual. São Paulo, Editora Brasiliense, 1990.

- RIBEIRO, José da Silva. NOTAS PARA UM DEBATE EM ANTROPOLOGIA VISUAL. Revista Mackenzie Educação, Arte e História da Cultura, 2003/2004. Disponível em http://www.mackenzie.br/fileadmin/Editora/Revista_Arte_Historia_Cultura/Revista_20Mack._20Arte_20jose_20da_20silva_20ribeiro_2006.pdf. Acesso em 07/07/10.


Texto produzido por Carla Luedy para o Gerts.


Ps: publico através da conta de Yérsia devido a problemas com a minha.


4 comentários:

Carla Luedy disse...

Bom pessoal...pequei em não citar o capítulo do livro ao qual se refere o texto.É o sétimo capítulo, intitulado "Corpos, símbolos e signos na cultura visual". Também não entendi porque estão aparecendo letras confusas no decorrer da postogem...nem porque algumas figuras não ficaram centralizadas...mas enfim, espero que agrade.

Carla Luedy disse...

O texto de Canevacci é excelente, aliás, todo o livro é muito bom para quem se interessa pela temática. A conexão que ele desenvolve entre a simbolização do corpo na cultura visual da década de 1990 é muito atual. A legitimação de uma suposta maturidade sexual resultante da exposição de atos normalmente privados também é muito relevante. Segundo ele, uma "ecologia do corpo" só pode ser compreendida a partir da simbiose entre a cultura do narcisismo e a cultura visual.

Frank Marcon disse...

Esta análise antropológica da relação corpo/símbolo explorada no texto, possibilita alguns ganchos interessantes, fundamentais para quem entra no debate sobre antropologia visual, seja ela voltada para produção/recepção/mediação das imagens em movimentos ou fixas. A imagem fílmica ou fotográfica torna-se o foco da análise simbólica. A partir daí cabe não apenas o interesse na interpretação do todo ou do "frame" mas também de linguagens, referências e narrativas que se constituem com certa constância, consolidando algumas formas sociais de existência. A partir daí entramos em outras searas.... Se aqui o corpo é tomado como referência e nos inspira nas reflexões sobre "consumo", "estilos de vida" e suas implicações nos proecessos de identificação/diferenciação, é porque ele passa a ser um ícone de representação num dado contexto (constituindo uma parte do todo nas simbologias que circulam midiaticamente no pós-guerra, como diz Canevacci). Para além, possibilitando outras formas de absorção deste texto, se consideramos que o consumo é uma forma de comunicação/interação social, teremos que tratar as imagens (ou simbolos) como tal, algo que se consome/comunica em tais relações, ativando sentidos de identificação e repulsa. A questão pode ficar ainda mais interessante se pensamos nas múltiplas alegorias que emergem destes processos de mediação visual, seja no âmbito da larga, média ou pequena escala (em termos de produção e consumo). Não há mais como pensarmos analiticamente as sociedades contemporâneas sem nos atermos as implicações dos médias visuais sobre os processos de idealização do mundo, o que implica em processos de identificação e conflitos dos mais variados segmentos.

Mesalas Santos disse...

Ola pessoal!!!
Sobre o texto, entendo que a cultura ou o meio cultural se torna elemento de manipulação consciente dos agentes simbólicos, em que a performance corporal é elemento reflexivo, na medida em que o modo de sua exibição constitui a auto-realização como um objeto para si mesmo, bem como para outros. Essa perspectiva se torna, especialmente, um potente meio de compreender o papel do “outro” e de olhar para “trás de si mesmo”, nos processos sociais. Acredito que o consumo alimentando essa corporalidade, assinala uma concepção diferenciada de entendimento da cultura, inscrita não apenas nos objetos, artefatos, monumentos ou textos, mas também, é revelada nas performances corporais.