terça-feira, 31 de agosto de 2010

A Sociedade do Consumo

BAUDRILLARD, Jean. A Sociedade de Consumo. Edições 70:Lisboa, 1995.

Apresento Jean Baudrillard, sociólogo e filósofo francês, falecido em 2007, cujo trabalho foi dedicado à análise da sociedade contemporânea partindo do princípio de uma realidade construída (hiper-realidade), em que a cultura de massa produz esta sensação de realidade virtual. Nascido em Reims, na sequência de um doutorado em sociologia foi professor desde 1966 na Universidade de Nanterre (Universidade de Paris X).
Detalhando a obra do autor, o termo consumo é recorrente nas suas análises da vida cotidiana. A sociedade de consumo é um termo utilizado na economia e sociologia, para designar todo tipo de sociedade que corresponde com uma avançada etapa de desenvolvimento industrial capitalista e que se caracteriza pelo consumo massivo de bens e serviços, disponíveis graças a produção massiva dos mesmos. O conceito de sociedade de consumo está atrelado ao conceito de economia de mercado que encontra equilíbrio entre oferta e demanda através da livre circulação de capital, produtos e pessoas, sem intervenção estatal.
A sociedade de consumo, como afirma Baudrillard (1995) mostra um mundo atual em que estamos totalmente rodeados por objetos, não de homens. O ser humano, apesar de ser criador de seus utensílios, apesar de ter o poder de criá-los, se sente dominado por eles. Vivemos por e para os objetos. O mundo em que vivemos está controlado por máquinas, elevadores que nos levam de um andar a outro, eletrodomésticos, a televisão que nos distrai de outros afazeres mais importantes etc. Embora não saibamos, somos totalmente escravos e dependentes das máquinas e dos objetos.
Uma das características dos objetos é sua abundância. Existem objetos para todos os gostos e para todos os usos. Todos os objetos que nos rodeiam são expoentes da abundancia, a falta da escassez. Outra importante característica do mundo dos objetos que nos rodeiam é sua distribuição em grupos. Por exemplo, os veículos, os alimentos, os eletrodomésticos…sempre estão acompanhados de outros objetos. Nesse sentido o objeto atua como significante e não como significado. O consumidor percebe o objeto não pela função que cumpre, mas pelo que significa para ele adquirir esse objeto por concreto em um tempo determinado.
Para se tornar um objeto de consumo, o objeto tradicional deve ser convertido em um signo que é carregado de conotações pessoais decorrentes da utilização, da interação com o objeto. Para Baudrillard, o consumo é, pelo que representa socialmente, uma ordem de manipulação de signos, ao ponto de converter-se na negação da realidade sobre a base de uma apreensão ávida e multiplicada de seus signos. O objeto do consumo é antes de tudo um signo que cumpre uma função de representação social que configura o status de pessoa e que de alguma maneira alheia da realidade.
A nossa capacidade de consumo é tal (o consumo de ideias), que todo instante existem várias campanhas publicitárias em que apenas mencionam o nome de um novo produto qualquer, sem informar do que se trata, gerando a necessidade de consumi-lo. Desta forma, surge um novo léxico idealista de signos, que representa o próprio projeto de vida. Nossa vida é consumir: o projeto está satisfeito com a sua aplicação através do consumo. E como a nossa vida é para consumir, o consumo não tem limites.
Os objetos se transformam em signos, de modo a se tornar objetos de consumo que em contraste com o símbolo, carece de significado dado pelo uso. Seu significado é arbitrário, pois é dado pela relação abstrata com outros signos. Entretanto, o consumo não é entendido somente por objetos, mas se estende ao campo dos sentimentos humanos. Baudrillard observa que as relações humanas são “consumidas” e “aniquiladas” através do consumo que atualmente, evoca todos os desejos, projetos, demandas, todas as paixões e todos os relacionamentos incorporados em signos e objetos a serem comprados e consumidos.
Na sociedade de consumo a realidade é um local onde apenas a ideia será consumida, a cultura da ideia de cultura, e não ela, ou a ideia de revolução, mas não a própria revolução. A nossa dinâmica existencial consiste na sistemática, e por tempo indeterminado, de objetos de consumo. Nesse sentido, afirma o autor que pensar, na ideia de consumo moderado, é assumir um moralismo ingênuo ou absurdo, pois o consumo como é concebido se torna um obstáculo ao progresso, baseando-se na fragilidade do efêmero, escondendo reais conflitos que afetam todos os indivíduos.
Segundo Baudrillard, o crescimento de uma sociedade tem relação direta com a manutenção de uma desigualdade social. A necessidade de manter uma ordem social da desigualdade, uma estrutura de privilégio, é o que produz e reproduz o crescimento como elemento estratégico. Assegura o autor que o crescimento não é símbolo de abundância, mas, pelo contrário, depende da miséria e da desigualdade entre as pessoas.
À guisa de conclusão, percebo que o drama “da alienação”, que sob a influência de movimentos marxistas, havia encorajado a sociedade no início do século XX, foi substituída, por uma ideologia centrada num mundo contemporâneo caracterizado por um processo de desmaterialização da realidade: o olhar do homem não é mais dirigido para a natureza, mas as telas de televisão, pois a comunicação tornou-se um fim em si mesmo e um valor absoluto.

By Mesalas Santos

sábado, 28 de agosto de 2010

Fredrik Barth – Grupos Étnicos e suas fronteiras

Frederick Barth nasceu em 22 de dezembro de 1928, em Lepzig na Alemanha. Fez o mestrado na Universidade de Chicago(1949) e seu doutorado na Universidade de Cambridge(1957). Sua carreira começou na Universidade de Bergen como professor de Antropologia Social, onde fundou o Departamento de Antropologia Social sendo em parte responsável pela universidade estar em posição central na pesquisa social. Atualmente é professor do Departamento de Antropologia da Universidade de Boston.
No livro intitulado “Grupos Étnicos e suas fronteiras” Barth traz uma abordagem sobre a etnicidade e a persistência das fronteiras criadas por partes das unidades étnicas.
A etnicidade estaria relacionada com a organização dos grupos étnicos, ela é atribuída pelos próprios autores, e as fronteiras seriam mantidas apesar da movimentação e intercambio entre eles, alem do que delimitariam a posição do grupo ou indivíduos nas diversas relações.
Certas relações estáveis são mantidas através dessas fronteiras baseadas em estatutos étnicos como afirma a seguir: “As distinções étnicas não dependem de uma ausência de interação social e aceitação, mas são, muito ao contrario, freqüentemente as próprias fundações sobre as quais são levantados os sistemas sociais englobantes”.(p. 186) .
Ele aborda 3 principais pontos nos ensaios desta obra.
1- define os grupos étnicos como categorias de atribuição e identificação realizadas pelos próprios autores, organizando assim a interação entre as pessoas.
2- explora os diversos processos que parecem estar envolvidos na geração e manutenção desses grupos.
3-desloca-se o foco de investigação interna aos grupos para as fronteiras étnicas e manutenção delas.
Barth utiliza as fronteiras para compreender as dinâmicas do grupo. Ele dinamiza a identidade étnica afirmando que ela não é estática, se transforma a partir das relações e como qualquer outra identidade, coletiva ou individual dependendo do interesse, ou contexto. A interação entre os sujeitos e grupos, permitem transformações continuas que modela a identidade, em processo de exclusão ou inclusão, determinando quem esta inserido no grupo e quem não está. Compartilham diversas características más principalmente esses grupos se organizam a fim de definir o “eu” e o “outro”. Se manifestam de maneira à categorizar e interagir com os outros.
Exteriormente atribuem aos grupos étnicos uma identidade baseada em fatores objetivos e que muitas vezes não correspondem as suas características reais. O autor recomenda que para entender as dinâmicas desses grupos é necessário levar em consideração as características que são significantes para os próprios atores.
Os grupos étnicos possuem padrões valorativos que os definem em quanto tal, e a forma como cada grupo ou cada um irá se portar em contato com outros grupos, na interação interétnica, com o intuito de adquirir visibilidade e dialogar com outro. No entanto esses padrões não são fixos, podem mudar e ressignificar-se em outro momento, conforme o contexto social.
Em suas pesquisas, ainda notou que os indivíduos e grupos com identidade étnica definem seus comportamentos a fim de ser coerente com sua identidade evitando praticas e situações que impliquem um desacordo com suas posições valorativas para evitar sanções sociais negativas. Ou seja, a manifestação de certas práticas dependem do contexto, da situação, do interesse por parte do indivíduo ou grupo.
A partir da análise das fronteiras se percebe as dinâmicas e interesses envolvidos no processo identitário, elas são mantidas a partir de um conjunto imitado de traços culturais. A auto-atribuição étnica irá influenciar na organização do grupo e interferir nas relações mantidas por eles.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

João Batista de Macedo Freire Filho possui os títulos de Mestre e Doutor em Literatura Brasileira pela PUC - Rio. Atualmente, é coordenador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da ECO/UFRJ.

O texto do João Freire Filho traz à baila uma discussão acerca das culturas juvenis e as conseqüências destas na sociedade, outrossim, um debate acerca dos paradigmas que, até então, trataram do tema.

O artigo principia com uma análise de algumas teorias sobre de culturas juvenis, salientando características, que hoje, teriam perdido seu potencial explicativo, pois, segundo o autor, há uma invisibilidade na teoria, pois não percebe, seja por questões epistemológicas ou propriamente políticas um conteúdo plenamente organizado nas culturas juvenis, entretanto, é comum uma associação direta às ideias de mercado, marginalidade e delinqüência.

Isso é, de fato, notável nos estudos sobre a cultural metal e do rock em geral, existe uma série de textos acadêmicos que aliam tais culturas à ilegalidade, patologias mentais e emocionais e afins. Ou ainda, a grande lacuna no que diz respeito à presença feminina nas manifestações político-culturais e especificamente nas subculturas juvenis.

O autor fala sobre a importância do Centre for Contemporary Cultural Studies- CCCS, dizendo que a teoria aqui criada dirimiu alguns preconceitos referentes às culturas juvenis, ademais contribuiu para a sofisticação da teoria subcultural. Afinal, o CCCS tinha como escopo desconstruir o conceito mercadológico da cultura juvenil e tratar de forma mais próxima e meticulosa as origens sociais, econômicas e culturais dos fenômenos e culturas dos jovens do pós-guerra, portanto, sem negligenciar variáveis de qualquer natureza, essa análise de agora seria feita numa perspectiva total, talvez dada, pela característica interdisciplinar do centro.

No presente artigo, porém há uma ressalva quanto à produção do CCCS, ressalva esta feita pelos pós-subculturalistas que baseados em marcos teóricos como a sociologia do gosto e a teoria da performatividade, Bourdieu e Butler, respectivamente, pretendiam reavaliar o trânsito entre os jovens, a cultura global e suas produções, incluindo agora uma noção de hibridismo e globalização. Essa reavaliação fez surgir um novo vocabulário ( neotribos, comunidades emocionais, canais, subcanais, estilos de vida, etc.) e afastando a noção de subcultura, cujo valor explicativo, havia esgotado.

Entretanto, para o João Freire Filho a questão de centro seria a resistência. Para ele e outros autores, o CCCS teria conferido um valor muito grande às manifestações criadas pelos jovens, porém não haveria nenhuma demonstração teórica ou histórica de que as agremiações juvenis do pós-guerra tivessem um núcleo, cujo potencial fosse notadamente, contra-hegemônico, assim, nota-se que nem todos os grupos ofereciam uma contrapartida para superar a tão criticada relação de subordinação.

O autor ainda discorre a respeito de subcultura que nasce em um contexto de margem, tornar-se do mainstream e em seguida retornar a sua origem ou para outros lugares, de modo diferente da percepção original, i.e., da absorção de novos elementos no seio da subcultura. Tal processo de hibridização dá-se, pelo contato com a mídia, seja de massa ou mídia de nicho, Estado e a própria relação de consumo desses bens culturais.

Ainda há uma discussão sobre movimentos espontâneos organizados para uma finalidade específica, a saber, um acidente ambiental, escândalos políticos, uma grande festa, nesses casos, segundo o autor, os envolvidos se agrupam em redes para dispersão de uma ideia tal, e fazem valer seus pleitos, desejos e sensações. Neste caso, a espontaniedade funciona como um canal que leva o envolvido até as subculturas, através dele que se conhece o grupo, os pares e sua história. Tal panorama mostra como a estrutura do grupo é efetiva, real e subjetiva.

Algumas subculturas quanto ao conteúdo político, sendo mais sagazes, outras mais frágeis, todas, porém interligadas pelo contexto de dispersão material e simbólica, atraindo sempre público, seja indistinto (massa ou ecumênico) ou distinto (convergência de identidade) para as suas realizações físicas ou virtuais sobre alguma temática das esferas pública ou privada, todas a sua maneira, manipulando uso de recursos da tecnologia da informação, todas gerando confusão entre um pensamento desejoso, o vivido, a prática concreta, etc. E os sujeitos envolvidos ávidos por solução, realização plena de seus gostos.

Jefferson Dantas sobre Das subculturas às pós-subculturas juvenis: músicas, estilo e ativismo político.

Postando antecipadamente :)



segunda-feira, 16 de agosto de 2010

CONSUMO COMO CULTURA MATERIAL

Resenha do artigo de Daniel Miller

Daniel Miller nasceu em 1954, é Doutor em Antropologia e Arqueologia pela Universidade de Cambridge, professor de Cultura Material e Antropologia do Consumo no University College em Londres (UCL), compõe o corpo editorial dos periódicos Journal of Material Culture e Journal of Consumer Culture, e editor do Material World, um blog acadêmico sobre cultura material, resultado de um projeto colaborativo entre o University College London e a New York University. Daniel Miller é também autor e organizador de mais de 20 livros nas áreas de cultura material e estudos do consumo, como: A Theory of Shopping; Culturas de carro; Posses Home: Cultura Material à porta fechada; a cultura material e consumo de massa.
No artigo proposto, Daniel Miller, faz uma discussão sobre o consumo e a cultura material. Inicialmente o autor faz um apanhado geral de como o consumo é visto e tratado por muitos acadêmicos, geralmente de forma pejorativa. Depois explana algumas perspectivas disciplinares para depois entrar na discussão antropológica. Por fim, o autor trata do consumo através da abordagem da cultura material, exemplificando com estudos sobre o carro, a casa, o vestuário e a mídia.
Originalmente, a impressão negativa do consumo esta ligada à relação entre consumo, produção e troca. A troca é superestimada, sendo a responsável pelas relações sociais. A produção representa a criatividade e funciona como uma auxiliar do consumo, e para o consumo resta o papel de vilão responsável pela eliminação de recursos, o que é ratificado pela perspectiva ambientalista onde o consumo é sinônimo de destruição. Outro fator que corrobora com a visão pejorativa do consumo é a idéia de moralidade deste, que surge antes mesmo do conceito de consumo de massa, onde existiria um padrão moral de necessidade para definir o que seria um consumo “bom”. Algumas religiões auxiliam esta visão defendendo o antimaterialismo, como o hinduísmo, budismo e o jainismo. Nessas religiões a oposição à cultura material esta sustentada teologicamente, da mesma forma que a acumulação de bens assegurados pela hierarquia natural da sociedade, onde existem padrões diferentes para plebeus e nobres. Essa distinção faz com que o consumo seja associado à riqueza e a mesma é responsável pelo relaxamento das regras sociais.
Para o marxismo ocidental o consumo é o que sustenta o capitalismo e faz com que a sociedade se empobreça, uma vez que os bens de consumo estariam substituindo as relações pessoais ao invés de representá-las. O consumo ainda é responsável pela perda de autenticidade e das raízes de um povo, como se o consumidor exercesse um papel passivo, e não fosse consciente do que se esta consumindo. O autor defende que existem outras formas de rotular as pessoas no capitalismo muito mais fortes que o consumo, como o trabalho que por muito tempo determinava a condição do individuo na sociedade.
O autor critica ainda os acadêmicos que romantizam o trabalho manual e denigrem a cultura do consumidor, uma vez que a maioria destes faz parte do segundo grupo e esquece que muitos dos problemas estão diretamente relacionados à falta de recursos e a pobreza como causa do sofrimento humano. Isso não quer dizer que o consumo deva ser incentivado unicamente pelo consumo e sim por sua simbologia e as relações que o mesmo produz.
Com relação às perspectivas disciplinares, duas ciências que mantiveram o interesse no consumo foram a economia e a administração. Ambas utilizam o consumo como forma de compreensão da relação das pessoas com o mercado. A economia se deteve principalmente às teorias e modelos de mercado, já a administração esta mais preocupada com um microambiente isolado de escolha do consumidor e realizou pesquisas, juntamente com a economia e a psicologia mais qualitativas e interpretativa, estas mais interessantes para as ciências sociais.
Já dentro dos estudos ligados as ciências sociais, foi feita uma analogia à comunicação dentro de um sistema simbólico, vários estudos buscaram compreender o valor simbólico do consumo e como as sociedades se adaptam as novas informações que são passadas através do marketing e da globalização, uma vez que a globalização não resultaria num processo de homogeneização pois cada povo teria uma forma própria de lidar com novos bens de consumo. Dentro da globalização, a internet funciona como elemento de localização, destruindo fronteiras locais e nacionais, já que este “lugar” esta presente em todos os povos e não pertence a nenhum.
A cultura material tem uma abordagem diferente sobre o consumo, onde a produção de bens não é apenas uma expressão do capitalismo e a compra não é o fim da reflexão sobre os bens de consumo, alguns bens tem significado próprio para cada grupo, a exemplo da motocicleta para os rockers. O autor ainda trás outros bens como:
Casa – que além da moradia, possui valor agregado através da arquitetura e do design é tratado como bem de consumo, e não só como local, existindo pesquisas sobre organização de mobília, noção de organização domiciliar, entre outros.
Vestuário – usos de peças como representação de vestimenta de grupos específicos, a simbologia de vestuário como espartilho e sutien para manifestações no decorrer da historia.
Mídia – os estudos sobre mídia, originalmente, diziam respeito a pesquisas de audiência. Depois passou a ser elemento de interesse geral, pois ela possui conseqüências no processo de formação da sociedade, abrangendo vários aspectos, como radio, televisão, etc.
Carro – este é um bom exemplo de como os bens devem ser relativizados, o uso e a importância do carro para o taxista é muito diferente da importância e do uso para um aborígene australiano.
Dentro deste artigo, podemos observar alguns aspectos muito importantes para o estudo da cultura material, o mais importante é a relação entre produção e consumo e não os dois separadamente; o marketing e o varejo que foram colocados em segundo plano nos estudos sobre consumo, mas que ocupam papel fundamental; a capacidade dos bens de representar afeto através de presentes e do apego material, como no caso citado no texto da mãe que perde seu filho num estagio avançado da gravidez ou o tem natimorto, ela demonstra através dos objetos comprados para a criança que os pais não perderam simplesmente uma coisa e sim um filho.
“O que esse estudo demonstra é como uma abordagem genuína de cultura material ao consumo começa e termina com uma compreensão intensificada e não reduzida da humanidade, ao reconhecer também a sua materialidade intrínseca” (MILLER, 2007). O consumo como cultura material demonstra que mesmo bens possuem bagagem simbólica e deve ser trabalhado como forma de compreensão social.

By LYS

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Blog do Daniel Miller

http://blogs.nyu.edu/projects/materialworld/

Gente, esse é o link pro Blog do antropólogo inglês Daniel Miller. Ele trabalha bastante com a antropologia do consumo. Vale a pena dar uma olhadinha!!

Tânia

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Totem e consumo: um estudo antropológico de anúncios publicitários

Resenha do texto de Everardo Rocha.

No presente artigo, Everardo Rocha irá discutir algumas idéias sobre as relações entre cultura e consumo. O autor pretende contribuir para a reflexão sistemática sobre um fenômeno que, segundo ele, foi relegado a segundo plano nas ciências sociais, em razão sobretudo do fascínio pela produção. Para ele, conhecer o consumo como fato social é algo bastante complexo, pois conhecer o significado do fenômeno do consumo passa pelo exame profundo de sua relação com a cultura.
Para entender o consumo é preciso conhecer como a cultura constrói esta experiência na vida cotidiana, como atuam os códigos culturais que dão coerência as práticas e como, através do consumo, classificamos objetos e pessoas, elaboramos semelhanças e diferenças. E assim ver que os motivos que governam nossas escolhas entre lojas e shoppings, marcas e grifes, estilos e gostos – longe de desejos, instintos ou necessidades – são relações sociais que falam de identidades e grupos, produtos e serviços.
Para explicitar de melhor forma, o autor relata uma experiência de consumo acontecida na chamada cultura do outro e compará-la com situações comuns de nossa vida cotidiana. Em viagem a cidade de Cochabamba, no altiplano boliviano, o grupo em que ele estava foram visitar uma feira nos arredores da cidade, algo como uma típico mercado nativo. Eles percorreram a feira como se estivessem num shopping: o desejo do consumo a flor da pele. E viam a possibilidade de reter tudo aquilo, querendo se realizar através da posse de qualquer coisa. O autor descreve suas impressões sobre a feira e descreve o que ele chamou de uma estranha loja. Seria um imenso lençol branco estendido no chão com diversos produtos que ele não sabia explicar o que eram exatamente, pois eram potes rigorosamente iguais que continham líquidos de várias cores. Passado todo o dia o grupo não comprou nada, nem comida. E concluiu que o que faltou para que o consumo fosse realizado foi o significado. Faltava um código, um sistema simbólico que completasse os objetos lhes atribuindo usos e razões. Faltava, enfim, a classificação capaz de oferecer sentido aos produtos. Faltava o sistema da mídia que recortasse os produtos sobre a forma de desejo, oferecendo significados sob a forma de utilidade. Por isso, segundo ele, não conseguiram na situação por ele descrita, achar nada de útil, não havia nenhuma necessidade racionalizando na direção da compra, nenhum desejo impelindo a emoção dos usos.
Rocha propõe, para aprofundar a experiência, uma análise comparativa com os nossos supermercados. Pensá-los às avessas. Sugere pensar num supermercado mágico, imaginário, cuja característica seria exibir seus produtos desprovidos de toda espécie de rótulo, etiqueta, tarja, nome, marca ou qualquer outra forma de identificação. Colocando esses produtos em recipientes iguais, obedecendo a uma única regra: adequar os continentes a natureza dos conteúdos. Assim, produtos em pó ou sólidos acondicionados em sacos plásticos, líquidos em pequenos frascos, gasosos em tubos de forma cilíndrica. Para completar, esses únicos modelos de embalagem seriam, rigorosamente, transparente.
Após pensar esse universo do supermercado imaginário, faz um questionamento: será que poderíamos comprar com absoluta certeza produtos desejados, necessários ou úteis? Ou correríamos o risco de confundir shampoo de ervas com detergente de limão, ambos verdes cheirosos e viscosos?
No entanto, ele coloca que nossa comunicação de massa, nosso sistema de marketing, publicidade e propaganda; as etiquetas, marcas, anúncios, slogans, embalagens, nomes, rótulos, jingles e tantos outros elementos distintivos, realizam este trabalho amplo e intenso de dar significado, classificando a produção e socializando para o consumo. É este processo de decodificação que dá sentido ou, se quisermos, lugar simbólico ao universo da produção. Dessa maneira, o consumo se humaniza, se torna cultural, ao passar, definitivamente, através dos sistemas de classificação. A relação de compra e venda é, antes e acima de tudo, relação de cultura.
No mesmo artigo, ele fala também de um outro trabalho mais extenso(Rocha, 1985) em que ele mostra que a publicidade é como um grande sistema de classificação e compara com o que Lévi-Strauss(1970, 1975) chamou de sistema de classificação totêmica. O totemismo elabora um sistema recíproco de classificações que articula séries paralelas de diferenças e semelhanças entre natureza e cultura. Os anúncios publicitários, elaboram, também eles, mas só que de diferenças entre produção e consumo.
Nesse sentido, os sistemas simbólicos formados pelos meios de comunicação de massa organiza o comportamento do consumidor – e o ato mesmo do consumo aí subjacente – que se realiza, antes de qualquer coisa, porque todos acessamos coletivamente os significados. Ao tornar público o significado atribuído ao mundo da produção, disponibilizando um enquadramento cultural e simbólico que o sustenta, este sistema realiza a circulação de valores e a socialização para o consumo. A cultura de massa libera o significado da produção dentro do universo do consumo e, nesse sentido, reafirma que a cultura é pública porque o significado o é, como nos ensina Geertz (1978).
O consumo é uma prática que só se torna possível sustentada por um sistema classificatório, onde objetos, produtos, serviços são parte de um jogo de organização coletiva da visão do mundo na qual coisas e pessoas em rebatimento recíproco instauram a significação. É necessário que exista antes um processo de socialização, distribuindo categorias de pensamento, para viabilizar o ato do consumo. Na cultura contemporânea, são os meios de comunicação de massa e o marketing – tendo a publicidade como face exemplar – a instancia que patrocina (no duplo sentido) este processo que permite a experiência do consumo.

BIOGRAFIA DO AUTOR DO TEXTO:
Everardo Rocha é Professor-associado do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio há mais de 30 anos. Doutor em Antropologia pelo Museu Nacional da UFRJ, é mestre em Comunicação pela Escola de Comunicação da UFRJ, mestre em Antropologia pelo Museu Nacional da UFRJ, bacharel em Comunicação Social pela PUC-Rio. Professor Colaborador do Instituto Coppead de Administrador e pesquisador do CNPq. Everardo é autor, entre outros, dos livros: A sociedade do sonho: comunicação, cultura e consumo; Magia e capitalismo: um estudo antropológico da publicidade; O que é etnocentrismo; Jogo de espelhos: ensaios da cultura brasileira; O que é mito; Comunicação, consumo e espaço urbano: novas sensibilidades nas culturas jovens (org.); Cultura e imaginário: interpretação de filmes e pesquisa de idéias (org.); Palmares: mito e romance da utopia brasileira (com Carlos Diegues).
Nasceu no Rio de Janeiro, 1 de outubro de 1951.

(RESENHADO POR TÂNIA DE OLIVEIRA)